O ranking das dietas

Todos os anos a revista americana US News and World Report faz um ranking das dietas. Não é um trabalho científico. Não é uma pesquisa. Não é um estudo. É apenas uma reportagem de uma revista leiga, que pergunta a um painel de “experts” suas opiniões sobre as várias dietas. Tais experts são pessoas proeminentes no mundo da nutrição dos EUA, e portanto alinham-se majoritariamente às diretrizes nutricionais vigentes. Ou seja, não se trata de uma metanálise, na qual estudo científicos originais são comparados de forma rigorosa e matemática (esses estudos foram feitos, e os resultados foram MUITO diferentes, mostrando que low carb é superior na perda de peso e em vários fatores de risco cardiovascular). Trata-se de uma peça de OPINIÃO. Pior ainda, um dos critérios utilizados para julgar se a dieta era boa ou não era seu grau de alinhamento com as diretrizes! Em outras palavras, uma dieta altamente eficaz e segura de acordo com os estudos científicos publicados, mas que seja oposta às diretrizes, será necessariamente colocada em último lugar.

Traçando uma analogia, seria como um concurso de miss no qual os critérios de julgamento incluíssem o fato de que loiras de olhos claros têm preferência. A mais bela morena não teria nenhuma chance, posto que o alinhamento com as diretrizes teria precedência sobre quaisquer outras qualidades!

Pois foi essa peça de opinião, não científica, que caiu nas agências de notícias e produziu manchetes pelo mundo afora – e vários de vocês me escreveram sobre isso.

Nosso amigo Hilton Souza, do blog PALEODIARIO, me fez um grande favor traduzindo um texto de Robb Wolf sobre o assunto, (que reproduzo parcialmente abaixo), além de maravilhosa refutação do Dr. Loren Cordain (leia mais abaixo).

US News & World Report classifica a paleodieta: 2014. Déjà vu de novo!

Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.

por Robb Wolf

Ano novo, noticías novas mesma baboseira

Meu Twitter e Facebook tem estado mais cheios que nunca. O tópico ? O ranking 2014 da US News das “Melhores Dietas”, que coloca a velha, fossilizada e caduca paleodieta… em ÚLTIMO. A paleodieta não foi apenas a última, mas também figura depois de concorrentes “científicos” tais como a Slim Fast e a Medifast! (Essas são dietas baseadas em shakes, pessoal…)

Se você está tentando descobrir o que está acontecendo, esse é o relatório anual de bajulação que a US News & World Reports (USNWR) fornece para coisas tais como os planos de shakes mencionados anteriormente, bem como a “competidores” fortes como a dieta do “Biggest Loser”. Para usar uma linha de Battlestar Galactica (N.T.: seriado de TV): Tudo isso já aconteceu antes, e vai acontecer novamente. Esse link é para a conversa anterior sobre esse ponto, na qual a USNWR afirmava que um grupo de experts classificou a dieta paleo em último, mas que quando colegas desses experts os questionaram sobre a classificação dada, pareceu que a USNWR poderia ter aplicado alguma “licença poética” às notas. Já se vai um longo tempo desde que o jornalismo era sobre acurácia e não hipérbole. Por favor leia o que escreve meu mentor, Prof. Loren Cordain, e os seus pensamentos sobre a classificação 2014. Cada vinheta de notícia, da CNN ao observatório de radiação de Chernobyl, proclamou: “A dieta paleo já era!”.

Bem, não estamos mortos ainda. E pelo menos a USNWR consegue soletrar “Dieta Paleo” corretamente, o que ajuda com as tendências do Google (google trends) – chego lá num instante.

Para onde vamos agora ?

As refutações mencionadas são bastante técnicas e detalhadas, não vou revisar esse material, mas quero prestar atenção em algumas das afirmações jogadas na listagem da USNWR:

1 – A dieta paleo provê nutrição inadequada

Esse não é um errinho, é um erro crasso. Por favor, veja o artigo anterior do Prof. Cordain e o trabalho do Dr. Mat Lalonde sobre densidade de nutrientes. Não tenho certeza sobre o que dizer sobre isso a não ser que as pessoas que tem essa opinião não se mantém atualizados com a literatura OU são péssimos em matemática. Assista o vídeo e confira você mesmo:

2 – A dieta paleo é difícil

Algumas pessoas fazem mudanças de dieta e de estilo de vida facilmente, outras preferem fumar através de um tubo de traqueostomia e assustar criancinhas com suas vozes sintetizadas, ao invés de mudar de comportamento. Para mim (opinião, pura e simples) o que é difícil é me sentir consistentemente horrível e viver uma vida sub-ótima. Já fiquei muito doente e não gostei realmente da experiência, mas talvez outros sejam diferentes. Tudo isso posto de lado, se alguém como a USNWR está afirmando que a paleodieta é “muito difícil”, pode ser bacana ter algo que justifique tal posição. Eu até discutiria que se o programa fosse realmente difícil ou não-efetivo para uma série objetivos (perda de peso, questões de saúde), então veríamos um interesse inicial e subsequente declínio. Você sabe, como aconteceu com a dieta “The Zone”


Talvez possamos usar o Google Trends para mudar essa informação claramente errônea ?

Zone diet – popularidade morrendo; Paleo Diet – popularidade aumentando de forma exponencial: se fosse tão difícil e não fosse eficaz, porque a popularidade só aumenta?

3 – Não há ciência suportando a Dieta Paleo

Essa acaba comigo… é demais pedir que as pessoas acessem o PubMed e pesquisem por “Paleo Diet” ? Acredito que eu deveria encarar isso não como incômodo, mas como estabilidade de emprego. Bem, as refutações são uma boa fonte de recursos para literatura revisada por pares sobre esse assunto, mas aqui está um trecho de um email que recebi do Prof. Cordain:

Já houve 8 estudos clínicos randomizados controlados da dieta paleo. Os assuntos abordados, incluindo riscos de doença cardiovascular, saciedade e perda de peso, indicam que paleo é superior à dietas convencionais para diabetes, dieta mediterrânea e mais rica em nutrientes que a pirâmide alimentar tradicional. As referências estão abaixo:


1. Frassetto LA, Schloetter M, Mietus-Synder M, Morris RC, Jr., Sebastian A: Melhorias metabólicas e fisiológicas ao consumir uma dieta paleolítica. Eur J Clin Nutr 2009.


2. Jönsson T, Granfeldt Y, Ahrén B, Branell UC, Pålsson G, Hansson A, Söderström M, Lindeberg S. Efeitos benéficos de uma dieta paleolítica em fatores de risco cardiovasculares na diabetes tipo 2: um estudo piloto cruzado e randomizado. Cardiovasc Diabetol. 2009;8:35


3. Jonsson T, Ahren B, Pacini G, Sundler F, Wierup N, Steen S, Sjoberg T, Ugander M, Frostegard J, Goransson Lindeberg S: Uma dieta paleolítica confere sensibilidade mais alta à insulina, proteína C-reativa mais baixa e menor pressão sanguínea que uma dieta baseada em cereais em porcos domésticos. Nutr Metab (Lond) 2006, 3:39. 


4. Jonsson T, Granfeldt Y, Erlanson-Albertsson C, Ahren B, Lindeberg S. Uma dieta paleolítica é mais saciante por caloria do que uma dieta tipo mediterrânea em indivíduos com doença cardíaca isquêmica. Nutr Metab (Lond). 2010 Nov 30;7(1):85


5. Lindeberg S, Jonsson T, Granfeldt Y, Borgstrand E, Soffman J, Sjostrom K, Ahren B: Uma dieta paleolítica melhora a tolerância à glicose mais que uma dieta tipo mediterrânea em indivíduos com doença cardíaca isquêmica. Diabetologia 2007, 50(9):1795-1807.


6. O’Dea K: Melhora pronunciada no metabolismo de carboidratos e lipídios em aborígines australianos após reversão para estilo de vida tradicional. Diabetes 1984, 33(6):596-603.


7. Osterdahl M, Kocturk T, Koochek A, Wandell PE: Efeitos de uma intervenção de curto prazo com dieta paleolítica em voluntários saudáveis. Eur J Clin Nutr 2008, 62(5):682-685.


8. Ryberg M, Sandberg S, Mellberg C, Stegle O, Lindahl B, Larsson C, Hauksson J, Olsson T. Uma dieta tipo paleolítica causa fortes efeitos específicos em tecidos em depósitos de gordura ectópicos de mulheres obesas pós-menopausa. J Intern Med. 2013 Jul;274(1):67-76

Então nós provemos material como esses aos detratores e ganhamos como resposa “Isso não é muita pesquisa, não podemos tirar conclusão ALGUMA disso”. Hummm, ok. Então continuamos a fazer o que não está funcionando? Outra dissidência comum nessa história é que muito do que falamos na paleolândia é anedótico. Sim, a maioria das descobertas clínicas é observacional. A maioria de todas as descobertas científicas COMEÇA observacionalmente, ao fazer com que alguém diga algo do tipo “Hum… o que diabos está acontecendo aqui? Me pergunto se é isso o que está acontecendo”. Observação leva à Hipótese que leva ao Teste que leva a Aceitar/Rejeitar/ou Refinar. O pessoal da Medicina Baseada em Evidências de alguma forma esquece desse processo… mas de uma maneira inteiramente seletiva e que serve a seus propósitos.  Por hora, temos o que já foi feito e mais algumas coisas na linha de produção:

Uma dieta saudável sem grãos, cereais e laticínios em pacientes com diabetes tipo 2: protocolo de estudo para um estudo piloto cruzado e randomizado – Alimentação e Diabetes em Lanzarote -ADILAN

Maelán Fontes-Villalba16*, Tommy Jönsson1, Yvonne Granfeldt2, Lynda A Frassetto3, Jan Sundquist1, Kristina Sundquist1, Pedro Carrera-Bastos1, María Fika-Hernándo4, Óscar Picazo5 and Staffan Lindeberg1

Esse estudo vai tapar alguns dos buracos no estudo original do Prof. Lindenberg da dieta paleo em humanos. O Prof. Cordain tem um estudo extenso que examina a eficácia da dieta paleolítica para várias condições auto-imunes, para as quais os dados preliminares são muito excitantes.

4 – Mas é uma estudo retrospectivo! Cientistas maus! Sem estudos prospectivos randomizados!

Bem, para os  que querem dados, esse é o processo para consegui-los. Observacionalmente, PARECEMOS ter benefícios notáveis para pessoas com auto-imunidade (e várias outros problemas). Dado que o nosso sucesso atual com terapias convencionais para auto-imunidade varia entre “não funciona” e “é pior que a doença”, parece interessante investigar isso mais a fundo, certo? Talvez a dieta paleo funcione melhor para auto-imunidade e outras condições  que uma dieta convencional, talvez não – mas novamente, esse é o processo que vai ajudar a responder a questão. Eu acho que muito do crescimento que vemos com paleodieta nasce do resultado que as pessoas tem.


Muitas ironias existem no caso, entre o surgimento forte da saúde ancestral na mídia e a reação violenta típica da mídia. A maioria dos quais eu consigo ligar à ignorância, inércia e, bem, mais ignorância – mas uma pequena ironia que certamente faz cócegas no meu “osso da risada” calcificado é que muitas pessoas que participam da cena paleo recentemente participaram em um chat do Twitter promovido pela… US News & World Reports Health. A conversa acabou sendo uma dos assuntos fortes no Twitter.

Então, tudo isso incomoda ? Sim, mais ou menos. Vai afetar o crescimento e o sucesso do modelo de saúde ancestral ? Não, nenhum um pouquinho. Nós conseguimos compartilhar informação muito rapidamente, as pessoas podem experimentar e compartilhar experiências e de uma maneira muito baseada em mercado, a coisa que funciona melhor VAI se tornar o paradigma vigente.

Para uma resposta mais aprofundada e científica à mesma reportagem em 2011 (sim, o assunto é velho), segue a reposta original de do Dr. Cordain à época:

-> Obrigado mais uma vez ao Hilton Sousa por traduzir o texto:

Artigo traduzido por Hilton Sousa. O original está aqui.

por Loren Cordain(i), Ph.D., Maelán Fontes Villalba(ii) e Pedro Carrera Bastos(ii)

i. Departamento de Saúde e Ciência do Exercício, Universidade Estadual do Colorado, Fort Collins, EUA

ii. Centro de Pesquisa de Cuidados de Saúde Primária, Faculdade de Medicina, Universidade Lund, Malmö, Suécia

O autor desse artigo (da revista US News and World Report) sugere que a dieta pelo só foi cientificamente testada em “um pequeno estudo”. Essa citação é incorreta, dado que cinco estudos (1-7), sendo quatro desde 2007, testaram experimentalmente versões contemporâneas de dietas humanas ancestrais e constataram ser estas superiores às dietas mediterrânea, dietas convencionais para diabéticos e a dieta ocidental típica no que diz respeito à perda de peso, fatores de risco para doenças cardiovasculares e fatores de risco para diabetes tipo 2.

O primeiro estudo a testar experimentalmente dietas desprovidas de grãos, laticínios e comidas processadas, foi feit pelo Dr. Kerin O’Dea na Universidade de Melbourne e publicado no periódico “Diabetes” em 1986 (6). Nesse estudo, o Dr. O’Dea reuniu 10 aborígines australianos de meia-idade que haviam nascido no “Outback” (N.T.: o “sertão” australiano). Eles haviam vivido suas juventudes como caçadores-coletores até não terem escolha a não ser finalmente se estabelecerem em uma comunidade rural com acesso a produtos ocidentais. Previsivelmente, todos os 10 sujeitos eventualmente tornaram-se obesos e desenvolveram diabetes tipo 2 ao adotarem o estilo de vida ocidental sedentário na comunidade de Mowwanjum, na região de Kimberly, norte da Austrália Ocidental. Entretanto, inerente em suas criações estava o conhecimento de como viver e sobreviver nessa terra aparentemente desolada, sem nenhuma das armadilhas do mundo moderno.

O Dr. O’Dea pediu que esses 10 sujeitos de meia-idade revertessem ao seu modo de  vida anteriore como caçadores-coletores, por um período de 7 semanas. Todos concordaram e viajaram de volta à terra isolada na qual nasceram. Seu sustento diário veio apenas de comidas nativas que puderssem ser coletadas ou caçadas. Ao invés de pão branco, milho, acúcar, leite em pó e comidas enlatadas, eles começaram a comer as comidas tradicionais de seu passado ancestral: cangurus, pássaros, crocodilos, tartarugas, mariscos, inhames, figos, yabbies (lagostas de água doce), peixes e mel silvestre. Na conclusão do experimetno, os resultados foram espetaculares, mas não inesperados dado o que se sabia sobre dieta paleo, mesmo na época. A média de perda de peso no grupo foi de 7.5kg; o colesterol sanguíneo diminuiu 12% e os triglicérides foram reduzidos em impressionantes 72%. Insulina e metabolismo de glicose voltaram ao normal, e suas diabetes efetivamente desapareceram.

O primeiro estudo recente a testar experimentalmente dietas paleolíticas foi publicado em 2007 (5). O Dr. Lindberg e associados colocaram 29 pacientes com diabetes tipo 2 e doença cardíaca em dieta paleo ou dieta mediterrânea baseada em grãos integrais, laticínios desnatados, verduras, frutas peixes, óleos e margarinas. Note que a dieta paleo exclui grãos, laticínios e margarinas enquanto encoraja um maior consumo de carne e peixe. Após 12 semanas em cada uma das dietas a tolerância à glicose sanguínea (um fator de risco para doença cardíaca) melhorou em ambos os grupos, mas ficou melhor nos que seguiram paleo. A repetição do mesmo experimento em 2010 mostrou que a dieta paleo era mais saciante, comparando-se caloria a caloria, que a dieta mediterrânea, porque causava maiores alterações na leptina, -um hormônio que regula o apetite e o peso corporal.

No segundo estudo moderno (2008) sobre dieta paleo, o Dr. Osterdahl e co-autores (7) colocaram 16 sujeitos saudáveis numa dieta paleo. Após apenas 3 semanas os sujeitos perderam peso, reduziram o diâmetro da cintura e experienciaram reduções significativas na pressão sanguínea e no inibidor do ativador do plasminogênio (uma substância do sangue que promove a coagulação e acelera o entupimento arterial). Como não foi usado grupo de controle nesse estudo, alguns cientistas argumentam que as mudanças benéficas podem não ter sido necessariamente causadas pela dieta paleo. Entretanto, expermimentos mais recentes e melhor controlados mostraram resultados similares.

Em 2009, o Dr. Frasetto e co-autores (1) pôs 9 sujeitos sedentários em uma dieta paleo por apenas 10 dias. Nesse experimento, a dieta paleo foi controlada para oferecer exatamente a mesma quantidade de calorias que a dieta típica dos sujeitos. Sempre que as pessoas comem dietas reduzidas em calorias, não importa quais comidas estejam envolvidas, elas exibem efeitos benéficos sobre a saúde. Então a beleza desse experimento foi que quais mudanças terapêuticas na saúde dos sujeitos não podia ser atribuída à redução d ecalorias, e sim às mudanças nos tipos de comidas ingeridos. Enquanto na dieta paleo, 8 ou todos os 9 participantes tiveram melhorias na pressão sanguínea, função arterial, insulina, colesterol total, LDL, colesterol e triglicérides. O que é impressionante nesse experimento é o quão rápido tantos marcadores de saúde melhoraram, e que isso ocorreu em cada um dos pacientes.

Em um estudo recente (2009) ainda mais convincente, o Dr. Lindeberg e colegas (2) compararam os efeitos da dieta paleo com os da dieta geralmente recomendada para pacientes com diabetes tipo 2. O dieta para diabéticos é voltada à redução da gordura total ao aumentar o volume de pães integrais e cereais, laticínios desnatados, frutas e verduras enquanto restringe comidas de origem animal. Em contraste, a dieta paleo era mais pobre em cereais, laticínios, batatas, feijões e produtos de padaria, mas mais rica em frutas, vegetais carne e ovos comparada à dieta para diabetes. A força desse experimento estava em seu desenho cruzado, no qual todos os 13 pacientes comeram uma dieta por 3 meses e depois mudaram para a outra dieta por 3 meses. Comparada à dieta para diabetes, a dieta paleo resultou em maior perda de peso, diminuição do diâmetro da cintura, pressão sanguínea, HDL, triglicérides, glicemia e hemoglobina A1c (um marcador para controle de glicose sanguínea a longo prazo). Esse experimento representa o mais poderoso exemplo, até hoje, da efetividade da deita paleo em tratar pessoas com problemas de saúde sérios.

Então, agora que sumarizei a evidência experimental suportando os benefícios de saúde e perda de peso da dieta paleo, gostaria de respoder diretamente aos erros no artigo do US News and World Report

1. “Você vai perder peso ? Não há como afirmar.” 

Obviamente, o autor desse artigo não leu o estudo feito por O’Dea (6)  e nem o estudo cruzado de três meses feito por Jonsson e colegas (9), que demonstraram o potencial superior para perda de peso de dietas paleo ricas em proteína e com baixa carga glicêmica. Resultados similares de muita proteína e baixa carga glicêmica foram recentemente reportados nos maiores estudos randomizados controlados já feitos tanto em adultos quanto em crianças.

Um estudo randomizado feito em 2010, envolvendo 773 sujeitos e publicado no Journal of Medicine da Nova Inglaterra (8) confirmou que dietas com alta proteína e baixo índice glicêmico eram a estratégia mais efetiva para manter o peso baixo. Os mesmos efeitos benéficos de muita proteína e baixo índice glicêmico foram dramaticamente demonstrados no maior experimento nutricional já conduzido, o Estudo DiOGenes  (9), em um conjunto de 827 crianças. Crianças seguindo dietas com pouca proteína e alto índice glicêmico tornaram-se significativamente mais gordas nos 6 meses do experimento, enquanto as crianças obesas e com sobrepeso que seguiram um plano nutricional rico em proteínas e pobre em glicemia perderam peso significativamente.

2. “Ela tem benefícios cardiovasculares ? Desconhecidos.” 

Esse comentário mostra o quão desinformado o autor realmente está. Claramente, essa pessoa não leu os artigos (1-6), que inequivocamente mostram os efeitos terapêuticos de dietas paleo sobre fatores de risco cardiovasculares. Mais ainda, como já revisamos em outros lugares (10-12), dietas com alta proteína comprovadamente aumentam a dislipidemia e a sensibilidade à insulina, e são estratégias potencialmente efetivas para melhorar a síndrome metabólica. Ainda mais, evidências acumuladas sugerem que uma dieta pobre em carboidratos (que é obviamente pobre em açúcar e cereais) pode ser superior a uma dieta ocidental pobre em gorduras e rica em carboidratos, especialmente em pacientes com síndrome metabólica – porque ela pod elevar a melhorias na resistência à insulina, lipemia pós-prandial, triglicérides e HDL-C séricos em jejum, razão entre colesterol total e HDL-C, distribuição de partículas de LDL, proporção apoB/apoA-1, função vascular pós-prandial, e vários biomarcadores inflamatórios (13, 14).

Finalmente, a evidência para recomendar grãos integrais para reduzir risco de doença cardiovascular é baseada em estudos epidemiológicos ou experimentos de intervenção com parâmetros de medição (endpoints) flexíveis, que estudos controlados randomizados com parâmetros inflexíveis não parecem suportar. Por exemplo, o estudo DART encontrou uma tendência à mortalidade por doença cardiovascular no grupo aconselhado a comer mais fibra, a maioria da qual é derivada de cereais (15). E de relevância, esse efeito não-significativo tornou-se estatisticamente significativo, depois de ajustes para possíveis fatores de confusão, tais como medicação e estado de saúde (16).

“E toda aquela gordura preocuparia a maioria dos experts.” 

Essa afirmação representa uma “tática de medo”, não substanciada por dados. Como eu, e quase a maioria da comunidade nutricional, já apontamos anteriormente, não é a quantidade de gordura que aumenta o risco de doença cardiovascular ou câncer, ou qualquer outro problema de saúde, e sim a qualidade. Dietas paleo contemporâneas contêm altas concentrações de saudáveis ácidos graxos ômega-3 e ácidos graxos monoinsaturados que na verdade diminuem o risco de doença crônica (10-12, 17-22). 

3. “Ela pode evitar ou controlar a diabetes ? Desconhecido.” 

Aqui está outro exemplo de jornalismo irresponsável e tendencioso, que não deixa os fatos falarem por si. Obviamente, o autor não leu o estudo de O’Dea (6) ou Jonsson et al. (2), que mostraram melhoras dramáticas na diabetes tipo 2 ao se consumir dietas paleo. 

“Mas a maioria dos experts em diabetes recomenda uma dieta que inclua grãos integrais e laticínios.”

Verdade seja dita, em um estudo randomizado controlado, 24 garotos de 8 anos de idade foram orientados a ingerir 53g de proteína sob forma de leite ou carne diariamente (23). Após apenas 7 dias na dieta rica em leite, os garotos se tornaram resistentes à insulina. Essa é uma condição que precede o desenvolvimento da diabetes tipo 2. Em contraste, no grupo da carne, não houve aumento na insulina ou na resistência à insulina. Além disso, no estudo de Jonsson et al. (2), dietas livres de leite e grãos mostraram ter resultados superiores na melhora de sintomas de doenças em diabéticos tipo 2. 

Finalmente, em um estudo intervencional incluindo 2263 mulheres pós-menopausa, as participantes foram aconselhadas a seguir uma dieta pobre em gorduras (< 20% da energia), rica em fibra de grãos integrais (> 6 porções ao dia), rica em frutas (> 5 por dia) e rica em vegetais (> 5 porções por dia) ou em um grupo de comparação sem aconselhamento. Após 6 anos de acompanhamento, as mulheres com diabetes que tinham diabetes no início do estudo e foram alocadas com a dieta pobre em gorduras e rica em fibra de grãos integrais, pioraram seu controle glicêmico (24). Não obstante, a maioria das evidências suporta os efeitos benéficos da fibra solúvel, encontrada principalemente em verduras e frutas, enquanto a evidência suportando os efeitos benéficos da fibra insolúvel, encontrada em grãos integrais, parece menos evidente (25-28). 

4. “Há riscos de saúde ? Possivelmente. Ao descartar laticínios e grãos, você corre o risco de perder um monte de nutrientes.” 

Mais uma vez, essa afirmação mostra a ignorância do autor e ruidoso desprezo pelos fatos. Porque as dietas ancestrais contemporâneas excluem comidas processadas, laticínios e grãos, elas são na prática mais densas em nutrientes (vitaminas, minerais e fitoquímicos) do que as dietas recomendadas pelo governo, como a pirâmide alimentar. Eu já apontei esses fatos em um artigo publicado no Jornal Americano de Nutrição Clínica em 2005 (11), jutno com outro artigo no qual analisei o conteúdo nutricional de dietas paleo modernas (19). Além disso, a análise de micronutrientes derivada dos dois estudos feitos por Lindebert et al. (5) e Jonsson et al. (2) mostra que, excetuando-se o cálcio, uma dieta tipo paleolítica não apenas atende a ingesta diária recomendada de micronutrientes, mas em alguns casos ultrapassa a quantidade provida pelas dietas com grãos e laticínios. No que diz respeito à vitamina D, como já mostramos em um artigo recente (12), exceto pelos peixes oceânicos gordos, há pouca vitamina D em qualquer produto alimentício natural (ou seja, não-fortificado artificialmente) comumente consumido – e através da história, quase todos os hominídeos (exceto por aqueles vivendo no extremo norte, tais como os inuit) dependiam do sol para satisfazer suas necessidades de vitamina D.

Ainda mais, a maioria dos nutricionistas está consciente de que comidas processadas feitas com grãos refinados, açúcares e óleos vegetais tem baixas concentrações de vitaminas e minerais, mas nem todos perceberam que laticínios e grãos integrais contém concentrações significativamente mais baixas das 13 vitaminas e minerais que mais fazem falta na dieta americana padrão, quando comparados com carnes magras, peixes, frutas e vegetais frescos (11, 19). Curiosamente, apesar da ingesta de micronutrientes ser importante, a absorção intestinal é ainda mais impactante. Sabe-se que alguns antinutrientes contidos em cereais, tais como o fitato, juntam-se a minerais divalentes (por exemplo, zinco, ferro, cálcio e magnésio) comprometendo a sua absorção (29)

“Também, se você não for cuidadoso e escolher carnes magras, vai rapidamente elevar seu risco de problemas cardíacos . 


Na verdade, as mais extensas e recentes meta-análises e revisões não mostram que o consumo de carne fresca, gorda ou magra, seja um fator de risco para doença cardiovascular – somente o de carnes processadas tais como salame, mortadela, bacon e salsichas (30). 

References

1. Frassetto LA, Schloetter M, Mietus-Synder M, Morris RC, Jr., Sebastian A: Melhorias metabólicas e fisiológicas ao consumir uma dieta paleolítica de caçadores-coletores. Eur J Clin Nutr 2009.

2. Jönsson T, Granfeldt Y, Ahrén B, Branell UC, Pålsson G, Hansson A, Söderström M, Lindeberg S. Efeitos benéficos de uma dieta paleolítica em fatores de riscos cardiovasculares na diabetes tipo 2: um estudo piloto cruzado randomizado. Cardiovasc Diabetol. 2009;8:35

3. Jonsson T, Granfeldt Y, Erlanson-Albertsson C, Ahren B, Lindeberg S. Uma dieta paleolítica é mais saciante por caloria do que uma dieta tipo mediterrânea em indivíduos com doença cardíaca isquêmica. Nutr Metab (Lond). 2010 Nov 30;7(1):85

4. Jonsson T, Ahren B, Pacini G, Sundler F, Wierup N, Steen S, Sjoberg T, Ugander M, Frostegard J, Goransson Lindeberg S: Uma dieta paleolítica confere maior sensibilidade à insulina, proteína C-reativa e pressão sanguínea mais baixas do que uma dieta baseada em cereais, em porcos domésticos. Nutr Metab (Lond) 2006, 3:39. 

5. Lindeberg S, Jonsson T, Granfeldt Y, Borgstrand E, Soffman J, Sjostrom K, Ahren B: Uma dieta paleolítica melhora a tolerência à glicose mais que uma dieta tipo mediterrânea em indivíduos com doença cardíaca isquêmica. Diabetologia 2007, 50(9):1795-1807.

6. O’Dea K: Melhora pronunciada no metabolismo de carboidratos e lipídios em aborígines australianos após reversão temporária ao estilo de vida tradicional. Diabetes 1984, 33(6):596-603. 

7. Osterdahl M, Kocturk T, Koochek A, Wandell PE: Efeitos de uma intervenção de curto prazo com dieta paleolítica em pacientes voluntários saudáveis. Eur J Clin Nutr 2008, 62(5):682-685.

8. Larsen TM, Dalskov SM, van Baak M, Jebb SA, Papadaki A, Pfeiffer AF, Martinez JA, Handjieva-Darlenska T, Kunešová M, Pihlsgård M, Stender S, Holst C, Saris WH, Astrup A; Projeto Dieta, Obesidade, and Genes (Diogenes). Dietas com conteúdos altos e baixos de proteínas e índice glicêmico para manutenção da perda de peso. N Engl J Med. 2010 Nov 25;363(22):2102-13

9. Papadaki A, Linardakis M, Larsen TM, van Baak MA, Lindroos AK, Pfeiffer AF, Martinez JA, Handjieva-Darlenska T, Kunesová M, Holst C, Astrup A, Saris WH, Kafatos A; DiOGenes Study Group. O efeito da proteína e índice glicêmico na composição corporal de crianças: o estudo randomizado DiOGenes. Pediatrics. 2010 Nov;126(5):e1143-52

10. Cordain L, Eaton SB, Miller JB, Mann N, Hill K. A natureza paradoxal das dietas de caçadores-coletores: baseadas em carnes, e ainda assim não aterogênicas. Eur J Clin Nutr. 2002 Mar;56 Suppl 1:S42-52

11. Cordain L, Eaton SB, Sebastian A, Mann N, Lindeberg S, Watkins BA, O’Keefe JH, Brand-Miller J. Origens e evolução da dieta ocidental: implicações de saúde para o século XXI. Am J Clin Nutr. 2005 Feb;81(2):341-54.

12. Carrera-Bastos P, Fontes Villalba M, O’Keefe JH, Lindeberg S, Cordain L. A dieta ocidental e os estilos de vida e doenças da civilização. Res Rep Clin Cardiol 2011; 2: 215-235.

13. Westman EC, Feinman RD, Mavropoulos JC, et al. Nutrição de baixo-carboidrato e metabolismo. Am J Clin Nutr. 2007 Aug;86(2):276-84.

14. Volek JS, Fernandez ML, Feinman RD, et al. Restrição de carboidratos dietários induz um estado metabólico único, afetando dislipidemia aterogênica, particionamento de ácidos graxos, e síndrome metabólica. Prog Lipid Res. 2008; 47, 307–318.

15. Peixe e o coração. Lancet. 1989 Dec 16;2(8677):1450-2

16. Ness AR, Hughes J, Elwood PC, Whitley E, Smith GD, Burr ML. O efeito de longo prazo do aconselhamento nutricional  em homens com doença coronariana: acompanhamento do experimento “Dieta e Reinfarto” (DART). Eur J Clin Nutr. 2002 Jun;56(6):512-8

17. Cordain L. Consumo de gordura saturada em dietas humanas ancestrais: implicações para a ingesta contemporânea. In: Phytochemicals, Nutrient-Gene Interactions, Meskin MS, Bidlack WR, Randolph RK (Eds.), CRC Press (Taylor & Francis Group), 2006, pp. 115-126.

18. Cordain L, Miller JB, Eaton SB, Mann N, Holt SH, Speth JD. Proporções de subsistência vegetal-animal e estimativas de energia de macronutrientes em dietas de caçadores-coletores no mundo. Am J Clin Nutr. 2000 Mar;71(3):682-92.

19. Cordain L. As características nutricionais de uma dieta contemporânea baseada em grupos de comida paleolíticos. J Am Nutraceut Assoc 2002; 5:15-24.

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