Quando escrevi a postagem anterior, denominada Flora intestinal – muito além dos carboidratos, pensei por um momento que seria uma postagem pouco popular. Afinal, é acima de tudo uma exposição de minhas dúvidas, de hipóteses novas e não testadas e temas complexos.
Me enganei. Nunca, em toda a história do blog, houve tantos acessos em um único dia. O que é mais relevante ainda por se tratar de um feriadão (quando tipicamente os acessos caem pelo menos 30%).
Minha interpretação é 1) meus leitores são, em sua maioria, pessoas sofisticadas, que apreciam um texto mais complexo; 2) as mesmas dúvidas que me inquietam, parecem inquietar muitas pessoas.
No entanto, fiquei preocupado com o contingente diário de novos leitores do blog que, ao lerem aquela postagem, podem sentir-se perdidos.
Então, como complemento da postagem precedente, ofereço aqui minhas reflexões e meu atual pensamento; se a portagem prévia teve um viés de análise, esta pretende ser uma síntese.
1) A insulina segue sendo um hormônio fundamental no particionamento das calorias em direção ao armazenamento.Estratégias para reduzi-la são, portanto, de grande utilidade (restrição de carboidratos), especialmente nas pessoas em que a causa do ganho de peso foi justamente o excesso de doces e farináceos;
2) Uma dieta bastante restrita em carboidratos – cetogênica em alguns casos – continua sendo uma intervenção terapêutica extremamente útil e eficaz para obesidade, síndrome metabólica e diabetes;
3) Levar em conta a evolução da espécie como uma base sobre a qual devemos estruturar a dieta (o que não significa tentar “comer como um homem das cavernas”) e como uma forma de avaliar a plausibilidade das hipóteses dietéticas continua sendo essencial;
4) O esquema básico da dieta continua sendo, como consta nesta postagem, o seguinte:
“Não há necessidade de complicar com fases, regras detalhadas, etc. aquilo que, no fundo, é simples:
1) Cortar açúcar;
2) Eliminar grãos (especialmente trigo e soja);
3) Evitar raízes (“tubérculos”, em especial batatas) se você precisa perder muito peso (caso contrário, não);
4) Optar por comida de verdade;
5) Não consumir gorduras artificiais (margarinas) e evitar as refinadas (óleos extraídos de sementes);
6) Perder o medo da gordura natural dos alimentos;
Pessoal, no fundo é só isso!! Precisa de um doce? Coma uma fruta.
Tá difícil perder peso? Elimine um pouco as frutas e/ou batatas. Cada um é diferente. Cada um precisa testar em si mesmo o que funciona, e aquilo que lhe torna possível seguir com o estilo de vida de forma continuada.¨
Isto não é comida de verdade:
Isto é comida de verdade:
5) Páleo não é necessariamente low carb. É possível fazer páleo com abundância de frutas e raízes. Quem já tem uma certa idade, talvez se lembre de um comercial que dizia “existem mil maneiras de preparar Neston. Invente a sua“. Pois então, existem 1000 maneiras de comer páleo.
- Ovo-lacto-vegetariano? Corte o açúcar e os farináceos; foque-se, além das saladas, em abacate, coco, nozes, castanhas, e suplemente com ovos e laticínios;
- Responde mal com gordura saturada? Faça uma versão “mediterrânea” da dieta: foque-se em abundância de vegetais, peixes e frutos do mar, azeite de oliva, nozes e castanhas, e laticínios como iogurte low fat – além de vinho tinto;
- Não quer perder peso? Apenas exclua o açúcar e os farináceos e evite alimentos processados, mas consuma frutas e raízes sem restrição, além do restante (carnes, frutos do mar, ovos e laticínios fermentados);
- Quer perder peso rapidamente? Faça páleo LCHF (low carb, high fat), sem frutas, mas com muita salada, ovos carnes, peixes e aves com sua gordura natural e laticínios full fat;
- Tem problemas de auto-imunidade? Além do glúten, remova completamente o que cresce em vagens, laticínios e ovos (e, eventualmente, algumas outras coisas: clique aqui para ler o protocolo auto-imune).
Essas são apenas algumas variações possíveis. Monte a sua, experimente – não somos todos iguais – só mesmo o governo poderia acreditar que há uma diretriz alimentar que vale para todos.
O que a postagem anterior ACRESCENTA é a possibilidade de que a flora intestinal esteja fortemente envolvida com a regulação hormonal do peso (set point). Esta flora alimenta-se das fibras solúveis presentes nos vegetais da dieta.
Em um primeiro momento, uma dieta de baixíssimo carboidrato exerce seus efeitos benéficos sobre o metabolismo reduzindo a insulina, a glicemia e os triglicerídeos. Além disso, a retirada do açúcar e da farinha ajuda a eliminar espécies patogênicas e pró-inflamatórias do intestino, cuja presença contribui para a resistência à insulina e leptina. No entanto, acaba eliminando também as fibras solúveis e o amido resistente (um tipo de amido que não pode ser digerido, sobre o qual falarei mais no futuro) que alimentam a flora intestinal saudável.
Assim, o que se postula é que uma dieta de muito baixo carboidrato (menos de 40g/dia) seja uma estratégia extremamente útil em um primeiro momento para alguns casos específicos (diabetes e/ou síndrome metabólica), mas que possa não ser ideal no longo prazo. O consumo abundante de vegetais (incluindo smoothies de hortaliças com frutas de pouco açúcar) e de frutas de baixa frutose é uma estratégia que pode ser universalmente adotada, com vistas a nutrir uma flora intestinal anti-inflamatória. Para aqueles que já toleram quantidades maiores de carboidratos sem ganho de peso e sem hiperglicemia, raízes como a batata doce, a batata inglesa e a mandioca poderiam ser consumidos. Mas, ao fim e ao cabo, há que experimentar.
Food for thought…