Maratonas em low carb

Há quem pense que a restrição de carboidratos serve apenas para perder peso. Nada mais distante da realidade. A restrição de carboidratos (low carb) é uma estratégia extremamente eficaz para o manejo de síndrome metabólica, isto é, das manifestações clínicas e laboratoriais da resistência à insulina. A perda de peso, que geralmente (mas nem sempre) ocorre, é um bônus, mas o que salva vidas é a reversão do quadro de síndrome metabólica.

Outro mito é o de que a síndrome metabólica acomete apenas os obesos e os sedentários. Na verdade, cerca de 40% dos portadores de síndrome metabólica têm peso normal. Outros tantos praticam esporte regularmente. Na verdade, síndrome metabólica ocorre quando uma pessoa portadora de resistência à insulina consome uma dieta com excesso de carboidratos, especialmente açúcar e farináceos – correr muitos quilômetros por semana pode até ajudar, mas não imuniza ninguém.

O relato abaixo ajuda a quebrar certos esteriótipos. Trata-se de um maratonista (ou seja, nem um pouco sedentário), magro, mas que me foi encaminhado com hipertrigliceridemia acentuada (triglicerídeos de 275 – normal abaixo de 150, ideal abaixo de 100 e colesterol total de 221 com HDL de 52).

Foi orientado a restringir os carboidratos da dieta; segue o relato:

Como previsto, nada mais do que natural


J. A. Nicotti

Prof. Literaturas brasileira

e russa e maratonista

“A história é simples e curta. Depois de ser visitado pelo herpes-zóster, procuro um infectologista. Exame vai, exame vem, triglicérides batendo na casa dos 270. Pré-diabético, então? Sem histórico familiar? Bom, penso, sempre alguém começa algo… Dr. Cassol (infectologista) não reflete bem assim. Como sou maratonista, indica-me o Dr. Souto, pois minha queixa passa também pela alimentação. Doces, massas e pães são resultados inclusive de um casamento glucídio. Leituras sugeridas pelo Dr. Souto e uma brincadeira deste: sempre quis mandar um professor de literatura ler. Li tudo o que havia de disponível para mim sobre o assunto. Retornei à consulta depois de um mês e meio com os novos exames. O tal triglicérides na conta dos 84. Mais um mês e pouco, baixa pra 66. O que dizer? Simples, como esta narrativa: eliminação do trigo e do doce nas refeições. Minhas corridas e treinamentos tornaram-se simples também como esta história, pois corro sem me sentir “pesado”. Sou alvo de algumas brincadeiras, pois levo, nos treinos de 21, 30 e 36 km, salame italiano, queijo, castanhas, sachê (que faço) de batata-doce, bacon, entre otras cositas mas. Os parceiros de corrida me chamam, às vezes, de “vendinha” ou “feira-livre”. Antes dos longões dos domingos, ou dos treinos da semana, um copo de leite às 6h. Depois, 3h de corrida tomando água e meus reforços acima citados. A leveza nos treinos não se torna o único fato positivo, pois minha recuperação pós-treinos é rápida. Em menos de 2h já não sinto desconforto nas pernas e quadril; dia seguinte já estou na pista da Sogipa para treinar. Lesões faz tempo que não as tenho. Meu pace médio caiu cerca de um minuto por km, assim como as distâncias aumentam e o pace pouco varia. Os treinos estão mais regulares, curtindo a corrida cinco vezes por semana, em torno de 90km. Meu peso? Bem antes: 82. Antes: 74. Agora: 70. Por causa da corrida? Claro que não! Fim dos carboidratos e doces. Se fosse por causa dos 30 anos de corrida, bom, eu tinha desaparecido do planeta! Outra coisa positiva: minha organização alimentar, orientada pelas leituras e pelo Dr. Souto, desde o início, tornou-se fácil, pois coloquei na minha cabeça a possibilidade de nunca ter sido apresentado para massas, doces, pães, guloseimas variadas, etc. A vida pode ser vista assim, afinal, quantas coisas não conhecemos e nem iremos conhecer? Visão simplista? Certamente, mas eficaz para o meu objetivo. Minha idade? 52. Meu objetivo para 2016? Correr três maratonas em três dias ou seis meias maratonas em três dias, pois terei que parar para comer batata-doce, salame italiano, queijo, bacon, castanhas, entre otras cositas mas, e isso leva um certo tempo, pois se alimentar é ritual, cuidado e elegância, além de evitar ao máximo delegar poder aos outros para nos alimentar. Coisas negativas já superadas: quantidade de gente assustada com minha aparência, meu enxugamento e crendo que estou doente com meus 70 kg. Sei que habituam, mas o problema continua, agora, em mim: será que me acostumo, novamente, a correr sem algum momento de prazer? A cada longa distância, sinto-me mais capaz de novos desafios. Quem sabe correr ainda por um bom e longo tempo na idade? A única certeza que tenho é que correr para mim é inevitável e, por isso, não tenho medo. O fim desta história: que peso levo comigo nas corridas? O tempo, aquele honestamente poetizado por Carlos Drummond de Andrade: Imenso / no pulso / este relógio vai comigo.”

                             ANTES —->  DEPOIS

Triglicerídeos:      275 ———>  66

Colesterol total:    221 ———>  188 

HDL:                      52 ———–>  73


Este relato soma-se ao relato do Saulo, nosso ultra-maratonista low carb (leia aqui). Não quero com isso dizer que restrição de carboidratos é a melhor estratégia para a prática desportiva. Mas este relato serve para deixar duas coisas bem claras:

  • Síndrome metabólica e resistência à insulina não são privilégios exclusivo de obesos e sedentários;
  • Uma dieta low carb é plenamente compatível com a prática de esportes, inclusive com ALTO volume de treino;

O Dr. Tim Noakes, médico do esporte e corredor sul-africano, que já participou de mais de 70 maratonas e ultra-maratonas, ao mesmo tempo em que ganhava peso e tornava-se diabético, finalmente leu Gary Taubes em torno de 2010, mudou radicalmente sua visão sobre dieta, restringiu carboidratos, perdeu peso e colocou sua diabetes em remissão. Tim Noakes tem uma frase antológica, que merce figurar em um quadro:

    “Os benefícios do exercício são incríveis… Mas, se você precisa se exercitar para manter seu peso, sua dieta está errada.”

    • A postagem acima exemplifica que o mesmo é válido para triglicerídeos, glicose, e outras características da síndrome metabólica.

     Livro do Dr. Tim Noakes – recomendadíssimo.

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