Foco primário em calorias ou em carboidratos? 1 – Pennington,1953

Esta é a primeira de 3 postagens mostrando que já se sabe há décadas que a restrição calórica voluntária não é a melhor alternativa para perda de peso.

Quem acompanha esse blog pode pensar que tudo isso é muito novo. Que somente agora o foco primário em restrição calórica está sendo questionado. Nada disso.

Quando o Dr. Atkins publicou seu livro, em 1972, a restrição de carboidratos como estratégia para perda de peso já tinha mais de VINTE anos na literatura peer reviewed.

Se você nunca ouviu falar no Dr. Pennington, você não está sozinho. Acontece que o Dr. Pennington era um acadêmico, que não publicava livros populares. E seu trabalho foi publicado antes do dogma pseudocientífico low-fat tomar conta do consenso nutricional, de modo que suas teses não eram particularmente controversas.

Gary Taubes, no obrigatório Por Que Engordamos, cita Pennington no trecho a seguir:

 

A seguir, vamos conhecer um artigo clássico do Dr. Pennington, publicado no American Journal of Clinical Nutrition em 1953.

O título é: “O tratamento da OBESIDADE com dietas SEM RESTRIÇÃO CALÓRICA”.

Neste trecho da introdução, o Dr. Pennington resume, em um parágrafo, aquilo que ainda hoje a ortodoxia nutricional tem dificuldade de compreender: que não há incompatibilidade entre o fato de que a perda de peso implica déficit calórico com o fato de que não é necessário controlar conscientemente as calorias para produzir perda de peso. Nas palavras dele: 

É bem sabido que a redução de peso requer que as calorias ingeridas sejam limitadas em um nível menor do que o gasto calórico. Esta limitação normalmente é feita através do esforço consciente de controlar o apetite, mas parece haver motivos para crer que isso pode ser obtido por forças fisiológicas as quais, atuando sobre o apetite, o regulam, de forma que o peso seja perdido sem a necessidade de forçar a restrição calórica. Em indivíduos normais, o apetite parece ser limitado por mecanismos regulatórios e, embora tais mecanismos estejam perturbados nos obesos, eles continuam a operar, embora no nível mais alto de peso corporal. Parece razoável. portanto, esperar que, se a causa de tal perturbação possa ser removida, esses mecanismos – ainda intactos – deveriam ajustar a ingestão calórica ao gasto calórico em um nível de peso normal“.

Mais adiante, podemos ver que a “descoberta” de que o metabolismo de pessoas que perderam peso com dietas hipocalóricas desacelera significativamente não é nada novo, e já era sabido há 60 anos:

Então, Pennington escreve um parágrafo que é pura genialidade (vou traduzir, abaixo):

Estimulação do uso da gordura durante a redução de peso

Seria desejável, no tratamento dos obesos, que dirigíssemos nossas medidas primariamente no sentido de aumentar a mobilização e utilização da gordura, ao invés de nos basearmos na duvidosa habilidade da restrição calórica em desencadear a utilização dos depósitos adiposos. Se a mobilização de gordura pode ser estimulada em nível suficiente, e a inibição da oxidação da gordura possa ser reduzida, seria então possível para os tecidos utilizar estes material nutriente (a gordura) no máximo de sua capacidade, e assim não haveria nenhuma falta de calorias para realizar os trabalhos metabólicos dos tecidos, e portanto nenhuma diminuição da taxa metabólica seria esperada. Isto, ao que parece, é a situação produzida quando a obesidade é tratada com dietas que não são restritas em calorias mas nas quais apenas os carboidratos são limitados

A seguir, Pennington discorre sobre a cetose como mecanismo normal e fisiológico, sua capacidade de reduzir o apetite, e por fim conclui que 60g de carboidratos por dia são uma quantidade adequada para perda de peso na maioria das pessoas.

Por fim, ele detalha a sua dieta que só peca por restringir desnecessariamente o sal:

Como se vê, não fosse pela restrição ao sal, seria muito parecido com uma dieta low carb moderna de 60g de carbs.

 Em outro artigo do mesmo ano, publicado no New England Journal of Medicine, Pennington aproxima-se assustadoramente da reposta correta (insulina é um hormônio chave na obesidade). De forma oposta ao que hoje se vê, usava-se menos tecnologia e mais cérebro nos anos 1950. A simples capacidade de observar e deduzir, levava Pennington à conclusão correta, muito embora, em 1953, ainda não houvesse forma de medir a insulina no sangue.

O trecho diz, de forma despretensiosa:

Este processo, que resultaria em aumento do tamanho dos depósitos adiposos, requer a presença de um pâncreas funcionalmente intacto“.

Hoje, diríamos: “o acúmulo de gordura requer insulina”. Nos dias de atuais, quando a tecnologia torna tal verificação tão fácil, paradoxalmente a maioria dos profissionais de saúde não consegue aceitar o que Pennington enxergava 60 anos atrás (usando apenas a lógica): que a regulação primária da adiposidade é hormonal, e que o balanço calórico é secundário (não devendo ser, portanto, o ponto primário de intervenção).

***

No próximo episódio desta série, vamos para 1956 responder a seguinte pergunta: será que todas as calorias são iguais?

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