Caso vocês ainda não saibam, a Sari (@lowcarbinspira), cuja voz vocês escutam todas as semanas no podcast Comida Sem Filtro, é também colunista do UOL, com a coluna Guia do Supermercado (além de realizar um extenso trabalho semanal em sua própria newsletter Descobertas, no Substack).
A coluna desta segunda-feira dia 19/08/2024 foi a culminação de um trabalho de jornalismo investigativo que expôs a falta de boa vontade e de respeito ao consumidor da Bacio Di Latte, uma marca famosa de sorvetes. Vou reproduzir apenas o começo, visto que a íntegra é disponível para assinantes:
O Vídeo da Sari que consta na reportagem é público e está disponível do YouTube do UOL:
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Para colocar em perspectiva a importância para os diabéticos de saber os ingredientes de um produto sem açúcar, fiz essa pergunta à nutricionista Ethienne Raschik, que é diabética tipo 1. Os assinantes da Área de Membros do blog têm acesso à reposta.
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Pois bem, depois de OITO MESES se RECUSANDO a fornecer a lista de ingredientes do sorvete diet, a empresa conseguiu finalmente cavar um desastre de relações públicas – que poderia ter sido evitado simplesmente fornecendo a lista para os consumidores. Como a Sari explica na reportagem, lista de ingredientes não é receita. A Coca-Cola tem lista de ingredientes na latinha, e nem por isso as pessoas conseguem fabricar Coca-Cola em casa – e tampouco a concorrência consegue copiar. Ou seja, não faz sentido alegar confidencialidade para ocultar os ingredientes do consumidor.
Eis que, para tentar apagar o incêndio, a Bacio publicou uma reposta em suas redes sociais, copiada e colada abaixo de cada comentário indignado dos seus seguidores:
“Reiteramos nosso compromisso com a segurança alimentar dos nossos consumidores e, por isso, disponibilizamos em todas as nossas lojas e via SAC as tabelas nutricionais e lista de alergênicos dos nossos produtos.
O gelato Cioccolato Diet segue as premissas da legislação brasileira para produtos com baixa adição de açúcar e para dietas com controle de açúcar.
O sabor teve sua receita atualizada e reforçamos que não é armazenado na vitrine justamente para evitar a contaminação cruzada com outros sabores. Para manter a transparência com nossos clientes, estamos revisitando nossas comunicações e trabalhando para disponibilizar informações adicionais, também em nosso site, o mais rápido possível.”
Minha reposta, postada por lá, foi a seguinte:
“1) A reportagem não questionou a segurança alimentar, e sim a FALTA DE TRANSPARÊNCIA por causa da RECUSA reiterada de fornecer a lista dos ingredientes;
2) A tabela nutricional não resolve: se houver 15 gramas de carboidrato, eles podem ser oriundos de eritritol, sorbitol ou polidextrose e não ter impacto glicêmico, ou ser oriundos de maltodextrina ou maltitol e ter impacto; a tabela nutricional, isoladamente, não adianta;
3) Ter a lista de alergênicos é necessário em todos os sabores, mas a pessoa que opta pela versão sem açúcar quer ter certeza de que o impacto glicêmico será inferior ao do açúcar, e é IMPOSSÍVEL saber isso apenas com a tabela nutricional sem saber com o que o produto foi adoçado, e se foi utilizada maltodextrina como ingrediente;
4) A reportagem nunca disse que o sorvete não cumpre a legislação para produtos com baixa adição de açúcar e para dietas com controle de açúcar. Ocorre que a legislação é falha, e permite amido e maltodextrina neste tipo de produto. E é JUSTAMENTE POR ISSO que o consumidor precisa da lista de ingredientes, para julgar se deve consumir o produto ou não;
5) O fato de a receita poder ser atualizada a qualquer momento reforça a necessidade de transparência sobre os ingredientes SEMPRE que o consumir perguntar sobre os mesmos em uma loja. Se tinha maltodextrina até o mês de junho e agora não tem mais, como ter certeza de que não terá novamente no mês que vem?
6) Saúdo a iniciativa de fornecer as informações completas a partir de agora (não apenas no site, mas em todas as loja do Brasil, que é o mínimo que esperamos). Mas precisou ocorrer todo esse desastre de relações públicas para que a empresa se dignasse a fornecer a lista de ingredientes? Isso deveria ter sido fornecido desde o início de forma espontânea, e com um sorriso nos lábios, e NADA disso estaria acontecendo. Afinal, a lista estava COLADA NOS POTES DE SORVETE o tempo todo! Custava mostrar para quem pergunta?
A reportagem não é sobre cumprir ou não a legislação, não é sobre segurança alimentar; é sobre ser solícito, simpático, transparente e respeitoso com seu consumidor”.
Que sirva de lição?
Eu tenho a esperança de que essa iniciativa da Sari ajude a elevar o custo de reputação das empresas que tratam seus consumidores com desdém e empáfia. Nem mesmo quando contatada pela Reportagem do UOL a Bacio se dignou a fornecer a lista de ingredientes – algo BÁSICO. Precisou fazer esse papelão ridículo de ceder na última hora, já com a corda no pescoço, e agora está lidando com as consequência de sua soberba.
Se a Sari, contando com o canhão do UOL, levou 8 meses para conseguir obter essa informação, que chances tem o consumidor comum, diabético, que apenas quer saber com que diabos seu sorvete é adoçado?
Quem sabe as demais marcas decidam optar pelo caminho virtuoso da transparência e, ao invés de se escorar na legislação para ocultar informações a um público vulnerável, prefiram conquistar as pessoas com base no respeito e confiança? A assimetria de poder entre a empresa e o consumidor é grande. Cabe à empresa nivelar essa relação.