Intuitivamente, no fundo, todo mundo já sabia. Diabetes é definido por um excesso de açúcar no sangue. Obviamente, o primeiro culpado a ser considerado deveria ser o consumo de açúcar. Mas a intuição é falha. A gordura na dieta, por exemplo, leva a à perda de gordura, e à diminuição da gordura no sangue.
John Yudkin já havia conduzido grande quantidade de estudos desde a década de 1950 que apontavam para o açúcar como causador de diabetes, resistência à insulina e obesidade.
No entanto, o Lobby da indústria do açúcar fez de tudo para financiar estudos epidemiológicos que contradissessem esta mensagem. Para quem lê inglês, não deixe de ler este artigo de jornalismo investigativo sobre o Lobby do Açúcar.
Pois bem, nosso já conhecido Robert Lustig é um dos 4 co-autores de um novo estudo que caiu como uma bomba esta semana. O estudo mostra que as evidências implicando o açúcar na gênese do diabetes são tão fortes quanto as que implicam o cigarro na gênese do câncer de pulmão.
Ou seja, o mundo científico não pode mais negar que as calorias não são todas iguais. 100 calorias de açúcar (uma barra de cereal, por exemplo), não são a mesma coisa que 100 calorias de um ovo. A barrinha de cereal e outras coisas açucaradas causam diabetes.
Segue uma tradução de um artigo do New York Times:
http://opinionator.blogs.nytimes.com/2013/02/27/its-the-sugar-folks/
É o açúcar, pessoal.
O açúcar é, de fato, tóxico. Não é o único defeito da dieta americana padrão, mas está rapidamente ficando claro que é um dos maiores problemas.
Um estudo publicado no dia 27 de fevereiro de 2013 na revista científica PLoS One liga o aumento no consumo de açúcar com o aumento das taxas de diabetes em 175 países na última década. E após levar em conta muitos fatores de confusão, os pesquisadores descobriram que um aumento na quantidade de açúcar na alimentação de uma população estava ligado a maiores taxas de diabetes independentemente das taxas de obesidade.
Em outras palavras, de acordo com o estudo, não é apenas a obesidade que leva ao diabetes: o açúcar pode causá-la também, independentemente da obesidade. E a obesidade, por sua vez, nem sempre leva ao diabetes.
O estudo demonstra isso com o mesmo grau de confiança que ligou o cigarro ao câncer de pulmão nos anos 1960. Como Robert Lustig, um dos autores do estudo e endocrinologista pediátrico na Universidade da Califórnia em San Francisco me disse, “é impossível realizar um estudo no mundo real que pudesse ser mais conclusivo do que este”.
O estudo controlou variáveis tais como pobreza, urbanização, idade, obesidade e atividade física. E controlou também o consumo de outros alimentos e as calorias totais. Em suma, controlou tudo o que era controlável, e satisfez os clássicos “critérios de Badford Hill” para o que é conhecido como inferência médica de causalidade: dose (quanto mais açúcar, mais diabetes), duração (se o açúcar está disponível há mais tempo, há mais diabetes), direcionalidade (não apenas o diabetes aumenta com mais açúcar, ele diminui com menos açúcar), e precedência (os diabéticos não passam a consumir mais açúcar; pessoas que consomem mais açúcar é que têm mais chance de tornarem-se diabéticas).
O ponto-chave deste artigo é “Cada aumento de 150 kCal/pessoa/dia em calorias totais correlacionou-se a um aumento de 0,1% em diabetes (não significativo), enquanto aumento de 150 kCal/pessoa/dia de açúcar (1 lata de refrigerante) estava associada com um aumento de 1,1% na prevalência de diabetes”. Assim, para cada lata de bebida adoçada com açúcar adicionada por pessoa, por dia, no sistema alimentar de um país, a taxa de diabetes sobe 1%.
Isto é tão bom (ou tão ruim) quanto é possível em um estudo, a coisa mais próxima de causa e efeito, o mais próximo de uma arma do crime que jamais veremos. (para “provar cientificamente” a causalidade, você teria que controlar completamente a dieta de milhares de pessoas por décadas. É, tecnicamente, tão impossível quanto “provar” o aquecimento global ou os danos cerebrais dos boxeadores ou, sob este aspecto, os cânceres provocados pelo tabaco). E, da mesma forma que as companhias de cigarro lutaram, ignoraram, mentiram e escamotearam na década de 1960 (e, de fato, até os anos 1990), os proponentes do açúcar farão o mesmo.
Mas, como diz Lustig, “este estudo é prova mais do que suficiente de que o açúcar é tóxico. Agora, é hora de fazer algo a respeito”.
Os próximos passos são óbvios, lógicos, claros, e são tarefa do FDA (agência americana que regula medicamentos e alimentos). A fim de cumprir sua missão, o FDA precisa responder a esta informação reavaliando a toxicidade do açúcar, chegando a um valor diário – quanto açúcar adicionado é seguro? – e idealmente removendo a frutose (a molécula “doce” no açúcar e que causa o dano) da lista de produtos “geralmente reconhecidos como seguros”, pois é isto que dá à indústria a licença para continuar contaminando nosso suprimento alimentar.
Em outro front, duas semanas atrás cientistas e defensores da saúde liderados pelo Centro para a Ciência em Prol do Interesse Público fizeram uma petição pública ao FDA para 1) estabelecer limites de segurança para o consumo de açúcar e 2) reconhecer que açúcares adicionados aos alimentos, ao invés de ainda permanecerem na lista de “geralmente considerados seguros”, deveriam ser declarados perigosos nos níveis em que são tipicamente consumidos (o FDA ainda não respondeu à petição).
Permitam-me resumir algumas coisas que o estudo do PLoS One esclarece. Talvez o mais importante, como vários cientistas têm insistido nos últimos anos, todas as calorias não são criadas iguais. Por definição, todas as calorias liberam a mesma quantidade de energia quando queimadas, mas nosso corpo trata as calorias do açúcar diferentemente, e esta diferença é danosa.
E, como Lustig lucidamente escreveu em “Fat Chance“, seu convincente livro de 2012 que trata das causas de nossa crise de saúde induzida pela dieta, está-se tornando claro que a obesidade em si não é a causa de nosso aumento dramático em doenças crônicas. Ao contrário, é a síndrome metabólica, que pode atingir pessoas de peso normal assim como obesos. A síndrome metabólica é o resultado da resistência à insulina, que parece resultar diretamente do consumo de açúcar adicionado. Isto explica o porquê da pouca discussão no mundo científico sobre os estudos que dizem que o sobrepeso não irá lhe matar. Tecnicamente, estes estudos estão corretos, pois a obesidade é um marcador de síndrome metabólica, e não a sua causa.
E suma: não é simplesmente comer demais que pode lhe fazer doente; é comer açúcar demais. Nós finalmente temos a prova que precisávamos para um veredito: o açúcar é tóxico.